O que aprendi ao mudar de carreira, mudar de vida e até de mim mesma
Quem me acompanha nas redes sociais – além dos amigos do analógico – sabe que fiz uma grande transição de carreira depois dos 40 anos.
(Ao escrever essa primeira frase, em apenas 15 segundos, surgiram alguns pensamentos críticos… Eu usei os 40 anos como um marco que traz consigo aquela aura de imponência, mas minha transição se concretizou aos 42 anos, por aí… E, eu escolhi o verbo “fazer” a transição e não “passar” por ela, de propósito… Afinal, mudar de área foi fruto de uma escolha, consciente, e não de um tropeço)
A questão que quero trazer com esse texto é a reinvenção profissional após os 40 anos. O que involve, suas consequências, os aprendizados, as angústias e alegrias.
O início do caminho tortuoso
No meu caso, refletindo com o cérebro de hoje, consigo entender o motivo.
A escolha da gastronomia teve relação com um momento que vivi de muita dúvida e imaturidade. Eu tinha acabado de voltar a morar na casa da minha mãe, depois de um curto, porém intenso período de vivências alternativas que incluíram morar no litoral de São Paulo, morar em Portugal, morar na Espanha enquanto fazia o Caminho de Santiago de Compostela…
Enfim, voltar para a casa da mãe sempre foi uma alternativa e agradeço demais por poder contar com ela, mas naquele momento, a carga era de urgência.
“Tenho 25 anos e ainda não conclui nenhuma faculdade!”
“Mas… E se eu ainda não souber o que quero fazer da vida?”
“O que eu sei fazer que pode virar profissão?”
Hoje enxergo esses questionamentos como normais… Eu só tinha 25 anos!
E achava que o tempo já era tarde para mim… 25 anos?
Gastronomia como ponte – não como fim
Foi então que a gastronomia sorriu para aquela mente inquieta como uma possibilidade rápida – o curso durava apenas 2 anos – e de fácil acesso – entrei no Senac em 7º lugar.
Minha vivência culinária antes da faculdade fora curtíssima… 2 anos como vegetariana me tornaram uma cozinheira bem mediana… Livro de receitas na mão, amigos cobaias e muita vontade de agradar.
O curso… bacana. Amigos… Posso dizer que três das melhores amigas da vida, vieram de lá e permanecem até hoje… para a eternidade.
Trabalho? Odiei trabalhar em restaurante. Aquela correria nada glamourosa, o calor, o suor, a roupa sintética, o machismo, o assédio…
Mas, foi em um dos estágios que conheci meu marido. Ele era da hotelaria, do room service. Fazíamos parte da mesma turma. Fazíamos sentido um para o outro. Fomos ficando e hoje sei que a gastronomia veio apenas para nos unir. E, depois, para fazer nossa filha, Maitê, existir.
Viva então a gastronomia, certo?!
Quando o doce vira amargo
Em dado momento, troquei o ritmo acelerado das cozinhas quentes pelos ateliês de bolos decorados… Ahhh, a confeitaria… Ela me permitiu escapar para um universo mais leve, mais colorido, mais técnico… literalmente, mais doce.
Atuei como confeiteira durante 15 anos… Aprendi muito. Empreendedorismo ensina muita coisa. E a mais valiosa – ao meu ver – resiliência.
Nada acontece do dia para a noite. Nada acontece sem esforço. Nada acontece sem coragem.
E foi preciso muita coragem para deixar a gastronomia para trás e embarcar numa nova jornada… Porque deixando os doces, eu deixava também sonhos e expectativas.
Toda aquela luta para fazer meu negócio acontecer iria embora quando eu desistisse dele… Mas, lutar por algo que já não agrega, que já não faz mais sentido, torna o sabor da luta, amargo. E não se pode viver de amargor, certo?
Brownies, pandemia e o começo do fim
A pandemia me aproximou do digital. Único ponto para ela.
Na época, eu fabricava e vendia brownies sem glúten e os clientes sumiram. Claro, quem é que precisa de doce sem glúten em pleno caos pandêmico? Alguns seres de luz – sim, tinha gente que achava que meus brownies eram os melhores do mundo – continuavam pedindo, mas a conta não fechava. E o digital parecia o único caminho possível para manter o desejo das pessoas pelos brownies.
E o universo digital abriu as portas para os estudos… E ali, eu senti uma coisa poderosa renascer dentro de mim. A sede pelo conhecimento!
O momento foi de epifania. Aprendi a usar o Canva (aplicativo que democratizou o design gráfico), fiz curso de fotografia de comida, curso de marketing digital voltado para o Instagram… Existia um mundo além da confeitaria e ele estava ali, bem perto de mim, pronto para ser desbravado.
Uma chama forte se acendeu e eu já não era mais a mesma Fernanda.
O novo eu, com mais idade e mais coragem
Os 40 anos ficavam para trás e o desejo de mudança surgia pela frente.
E eu mudei. E me reencontrei. E tudo voltou a fazer sentido.
Resiliência? Hoje preciso dela mais que de todo o resto.
Porque recomeçar “tardiamente” traz consequências que pedem paciência.
Estudar para aprender novos saberes, novas ferramentas…
Entender a dinâmica do novo negócio…
Lidar com as demandas dos novos clientes…
Ou ainda não ter clientes, mas ter boletos a pagar…
Enfim… recomeçar tendo vida adulta real para bancar não é nada fácil.
Isso porque faço parte de uma “elite” privilegiada que tem para onde correr quando as coisas apertam… Imagine quem não tem?
Final provisório – porque a história continua
Bom, esse texto não terá um final bem demarcado, pois essa história ainda está acontecendo enquanto escrevo… E eu só espero que o final seja feliz, pois o “enquanto” está sendo muito, mas muito interessante de se viver.